“Ousemos gerar o caos nas velhas idéias, e façamos da universidade um grande laboratório da ciência a serviço do povo e da Revolução.” – MEPR
“Quem explica os problemas políticos, econômicos e sociais da sociedade contemporânea? Quem comenta a moderna literatura política revolucionária, reacionária ou reformista? Nossos catedráticos parecem estar vivendo à margem, sem contato, sem comunicação com a realidade, parecem viver à margem dos novos tempos. Parecem ignorar os pensadores, teóricos e críticos desses novos tempos. Talvez alguns se achem mais ou menos bem inteirados, mais ou menos bem informados. Mas, nesse caso a pesquisa não lhes suscita inquietação. Neste caso, a atualidade mundial deixa-os indiferentes. Neste caso a juventude tem sempre o direito de acusá-los de insensibilidade e de impermeabilidade”.(…)
“Os catedráticos preocupam-se única e exclusivamente pela bibliografia de seu curso. Seu vôo mental, geralmente, não vai além do âmbito rotineiro de sua cátedra. Todos são conservadores definidos ou conservadores potenciais, reacionários latentes, que em política doméstica suspiram impotentes e nostalgicamente para a velha ordem das coisas. Medíocres mentalidades de advogados, gerados nos alvéolos ideológicos do civilismo; temperamentos burocráticos, sem asas e sem vértebras, organicamente pequenos, acomodatícios covardes, índole de classe média, vulgares, antiquados, limitados e estéreis, sem grandes ideais, forjados para o horizonte burguês de um representante de uma corte suprema, de um diplomata ou de um alto cargo consultivo numa rendosa empresa capitalista. Esses intelectuais sem uma verdadeira filiação ideológica, amantes de tendências aristocráticas de doutrinas de elite preocupados com reformas minúsculas e com diminutos ideais burocráticos têm o estigma da mediocridade. Ao lado desta gente negativa, com fobia de povo, com fobia de multidão, maníaca de estetismo e de decadentismo, confinada no estudo escrito das idéias pretéritas, a juventude sente-se órfã de mestres e órfã de idéias. ” – (“Crise de mestres, crise de idéias”, publicado em Claridad, 1919; Jose Carlos Mariategui, revolucionário peruano)
A universidade em nosso país tem padecido de uma grande enfermidade: a falta de entusiasmo, de ousadia, e um idoso conformismo. A maioria dos estudantes passa nas faculdades apenas para assistir às aulas e entregar trabalhos. Os currículos não entusiasmam, não provocam debates nem instigam novas perguntas e críticas. Os ansiosos calouros, logo nos primeiros dias têm grandes decepções quando assistem às aulas e as comparam com todas promessas dos bonitos manuais de candidatos. Caem por terra todas vitalidades juvenis em aprender coisas novas.
Acreditávamos que ao entrar na universidade daríamos vazão aos grandes questionamentos da humanidade, teríamos novos instrumentos para compreender palpitantes questões da atualidade. Entender os conflitos mundiais, nos posicionarmos a partir da ciência sobre a clonagem, religiões, desemprego, economia, energia nuclear, direitos internacionais e tantas outras questões que permeiam o mundo hoje; mas, ao contrário, nos apresentam um currículo insosso, sem vida, preso à institucionalidade de contratos com empresas ou à vaidade de um ou outro respeitável professor doutor de tal ou qual especialidade, que em nada interessa e de nada serve aos grandes problemas da sociedade e de nosso país. Raros são o contrário.
Verifica-se isso logo que se conversa com algum estudante de 3º ou 4º período. Muitos têm duvida se pretendem continuar o curso e quando pretendem, desejam logo terminar as disciplinas e correr para a formatura. Outros pulam de curso em curso na esperança de encontrar algum estímulo para continuar a estudar.
Mas a crise não é somente de mestres e idéias e sim institucional, na medida em que nossas universidades estão se transformando em filiais das multinacionais, sendo literalmente privatizadas. Cada vez somos obrigados a pagar mais taxas nas universidades públicas, como forma dos governantes aliviarem o caixa do Estado com a educação. Enquanto nas universidades particulares acontece o roubo descarado por parte destes políticos empresários que, com as abusivas mensalidades, transformaram a educação em um grande negócio onde lucram milhões.
Autonomia e Democracia versus Mercantilização da educação
A crise geral do capitalismo, estalada a partir da década de 80, provoca a reestruração em escala mundial do modelo de acumulação capitalista que vigorava desde a Segunda Guerra. Essa nova reestruturação, batizada de “neoliberalismo”, retira grande parte da iniciativa e do papel econômico do Estado, transformando serviços públicos, como educação e saúde, em mercadorias lucrativas, incluídas no circuito do mercado. A mercantilização da educação implica em introduzir esse serviço no sistema que vigora no mercado, transformando as escolas técnicas e as universidades principalmente, em empresas capitalistas, com todo seu sistema de concorrência, de avaliação de custos, de rentabilidade, de definição de prioridades. Os objetivos e resultados sociais da educação são relegados a último plano, atendendo à principalidade dos objetivos e resultados econômicos.
Nestas condições de controle do saber pelos monopólios capitalistas, questões fundamentais como democracia e autonomia não passam de discursos, ficando longe de serem praticados. A começar pelas decisões políticas e acadêmicas onde a maioria dos estudantes, professores e funcionários não participa em nada das decisões. Os conselhos, departamentos, colegiados, congregações são controlados por puxa-sacos de diretorias e reitorias escolhidos pelo sistema de lista tríplice. Vejam só, sabemos que o processo eleitoral de nosso país é uma farsa, mas pelo menos eles disfarçam mais, quando quem ocupa o cargo disputado é quem teve o maior número de votos. No caso das eleições para reitoria e diretorias nas escolas e universidades públicas federais chega a ser ridícula a demagogia quando se fala em democracia e autonomia, pois quem escolhe a direção da universidade é o presidente da república e o ministro da educação. E depois ainda dizem ser exagero quando se afirma que a universidade ainda vive no regime do império colonial.
Quanto ao currículo dos cursos da universidade também não opinamos em nada. Quem decide tudo isto são os órgãos burocráticos que dominam a universidade. Quando se questiona o currículo e se fala em reforma, é só para se adequar às “novas necessidades de competição no mercado de trabalho”. Nunca podemos opinar, nem mesmo para avaliar o curso, o currículo e os professores. Isso é função do MEC, que através de métodos avaliativos como o “provão” (sob a falsa alegação de que este serve para melhorar a qualidade de ensino), apenas verifica se os planos dos grandes monopólios estão sendo aplicados e dando resultados. O mesmo ocorre com as pesquisas também direcionadas de acordo com os interesses dos monopólios e são raras as vezes que conseguimos desenvolvê-las desvinculadas deste tipo de interesse. Quando conseguimos, não há financiamento para aplicação dos projetos que visam melhorar a vida do povo, somente os que dão muito lucro recebem recursos. Todo o espaço de grandes debates e grandes discussões, das inovações científicas ou da busca de novas técnicas ou teorias é preenchido pelas gélidas disciplinas para melhor nos formar para o mercado de trabalho.
A universidade transformou-se numa ilha fora da realidade popular.
Desde que o imperialismo norte-americano lançou sua grotesca propaganda de “fim da história”, acentuou-se o direcionamento das aulas que são resumidas a específicos debates de pequenas quimeras do conhecimento. Afasta-se gradualmente dos grandes debates de nosso tempo. Os laboratórios produzem pesquisas desligadas do interesse social, dos problemas de nosso povo e afundam-se em especificidades de suas especializadas disciplinas. Cursos como medicina, engenharia, bioquímica, odontologia, pedagogia, não se voltam para pesquisas sobre os problemas que afetam a maioria da população. Os médicos extensivistas (que estudam e praticam a clínica geral) são vistos como de segunda categoria, pois o que interessa são os profissionais especializadíssimos formados para utilizar a tecnologia de ponta para poucos. Doenças tropicais, problemas como a desnutrição e as diarréias continuam matando milhões de crianças sem merecer atenção por não serem rentáveis. As pesquisas no campo da bioquímica atendem à indústria de medicamentos, preocupada com seus “royalties” e em auferir o lucro máximo, sem a menor preocupação em relação à imensa maioria que morre sem tratamento pela impossibilidade de adquiri-los. A engenharia passa longe da discussão de técnicas de barateamento de materiais de construção, por exemplo, enquanto volta-se apressadamente para a robótica. A imensa maioria da população continua arrancando os dentes como única forma de tratamento, enquanto se desenvolvem as mais sofisticadas técnicas de implante. Os futuros quadros profissionais da educação, nos cursos de Pedagogia, aprendem a formar alunos atendendo às encomendas das grandes empresas capitalistas. (Ver matéria sobre o curso de Pedagogia)
A Universidade eleva os muros que a separam da sociedade no processo crescente de sua privatização. Distancia-se das tensões que vivemos em nosso tempo. Finge não ver a luta de classes e muito menos o povo pobre de nosso país. As salas de aula parecem mausoléus sombrios, sem calor, sem disputas, sem luz. Quando há debates, esses têm de fundo a disputa por status ou eleições da burocracia de departamentos, um circo de vaidades e discursos vazios. Prolifera o culto da não interação na realidade, de cultivar a inércia política. Uma das mais propagadas idéias é de um relativismo conformista, de que nada vale a pena, de que nada podemos fazer, e é melhor nada dizer.
Para corresponder aos planos de controle do conhecimento, impõe-se o modelo burguês de instrução, com currículos que desenvolvem um saber empírico e fragmentado, onde a especialização é desconectada da realidade do mundo. Seguindo essa rota definida pelos planos imperialistas para os países dominados, é “natural” que se produza e se estimule a inércia política, o estudante acrítico e conformado.
Para aplicar essa política mercantilista na educação é necessário contar com quadros profissionais que a defendam e a formulem com ares de teoria. É por isso que tantos doutores da universidade atacam ora descarada ora sutilmente o marxismo, pois sabem que é ele que dá a resposta à vontade transformadora da juventude que deseja estudar para servir ao povo e não para se conformar com essa realidade; é ele que afirma que o conhecimento só é produzido junto à transformação da sociedade. Por isso investem pesado desde o primeiro período para tirar da cabeça dos estudantes toda a curiosidade quando não a simpatia que a imensa maioria tem pelo marxismo.
A universidade precisa quebrar seus muros, polarizar nas questões que afligem nosso povo, nossa sociedade.
O oportunismo serve a essa Universidade reacionária
A aplicação da nova reestruturação capitalista no processo educativo, levou a um direcionamento consciente para a despolitização. As faculdades das chamadas ciências humanas que já foram quartéis generais da luta estudantil revolucionária no final da década de 60, hoje estão dominadas por autores que defendem a tese anticientífica do “fim da história” e que, portanto, é impossível qualquer tipo de transformação radical e profunda na nossa sociedade, negando o antagonismo e a luta de classes, não tomando partido em relação aos conflitos que ocorrem no mundo.
A aplicação, no conjunto da sociedade, da política imperialista nos planos social, econômico, político e ideológico, levou ao fortalecimento temporário da ação dos oportunistas. No plano político, interessava ao imperialismo a substituição dos regimes militares por governos eleitos, isso tudo sem mudar nada na essência, apenas para conter a resistência popular que voltava a crescer no final da década de 80. A implementação dessa política designava um papel destacado ao oportunismo que, surgindo de dentro do movimento popular, passou a controlar os movimentos sociais, fazendo coro com a propaganda demagógica de que enfim fora conquistada a democracia. Legitimando a farsa eleitoral, os oportunistas dizem que não é preciso mais radicalizar a luta, que agora é só votar no melhor candidato que todos os problemas se resolvem pois o povo reconquistou o direito de voto e pode expressar-se “sem repressão” dentro e fora das universidades. Ora, se a repressão tinha se enfraquecido, aí sim é que estava na hora de radicalizar mais, aproveitando a situação de enfraquecimento do fascismo do Estado brasileiro para então o movimento popular revolucionário acumular forças para uma transformação profunda e verdadeira, a revolução em nosso país.
A partir de então, o imobilismo, a paralisia, a apatia reinaram na universidade. O movimento estudantil da UNE, agora preocupado em pintar a cara, abaixar as calças, organizar campanhas cívicas patrocinadas pela rede Globo e fazer festas para eleger seus candidatos, parasita a universidade e tenta abafar o espírito rebelde desorganizando a luta estudantil. O auge desta festança promovida pelos oportunistas foi o “Fora Collor”, um movimento criado pela mídia, fruto da necessidade da burguesia, do latifúndio e do imperialismo de mudar o gerente de plantão do Estado brasileiro, Collor de Melo, porque sua roubalheira descarada desmoralizava o projeto das classes dominantes. Aquele movimento organizado e combativo das décadas de 60 e 70 (ver box sobre 68), foi substituído por um modismo, um estilo festivo, que no fundo não abala um milímetro da estrutura das classes dominantes brasileiras. A atuação do oportunismo da UNE desviou a luta dos estudantes para movimentos de desgastar governantes através da canalização para o projeto eleitoral em lugar da luta pela transformação desse sistema. Isto facilitou a ação do Estado reacionário, que através de seus governos de turno, como o de FHC desde seu primeiro mandato como sucessor de Collor/Itamar até nossos dias, na implementação de seus planos de desmantelamento do ensino público, privatizando as universidades pouco a pouco, colocando-as sob o controle dos grandes monopólios.
O novo movimento estudantil, popular e revolucionário
Os momentos de efervescência e paixão revolucionária vividos pelos estudantes nas décadas de 60 e 70, foram conseqüência da postura rebelde e inconformada, oposta às propostas do oportunismo no movimento estudantil e na própria vida acadêmica. A política imposta pelo imperialismo, longe de representar uma força inabalável, demonstra cada dia, em todo o mundo, seu esgotamento, sua imensa dificuldade de aplicação. Os povos em todos os países oprimidos resistem e lutam e para que nós estudantes somemos nossa força a esta resistência é necessário construir e desenvolver um verdadeiro movimento estudantil revolucionário, combativo e rebelde que sirva ao povo e à construção do poder popular em nosso país; que liberte a universidade da prisão do capital para produzirmos a verdadeira ciência. É para isto que estamos nos organizando enquanto historiadores, médicos, pedagogos , agrônomos do povo. Para atuarmos efetivamente na luta de classes e assim aprendermos, na prática social revolucionária, como desenvolver a ciência, fundidos com quem tem a capacidade da transformação deste mundo: as classes exploradas pelo capital.
O movimento estudantil em 68
O grande auge do movimento estudantil nas décadas de 60 e 70, foi expressão da luta de classes que se agudizava com a crise geral do sistema capitalista, expressando-se nas radicalizadas lutas antiimperialistas, nas guerras de libertação dos povos do mundo contra os ianques e demais potências, como foi o caso do Vietnã, Cuba e Coréia do Norte. 1968 foi um ano marcado por intensa mobilização estudantil no Brasil, na América Latina e em todo o mundo. Estudantes participaram da luta armada que se desenvolvia em dezenas de países. Isto por grande influência dos avanços do socialismo, particularmente com a grande Revolução Cultural Proletária da China iniciada em 1966.
No Brasil, o aumento da fome do desemprego, o cenário da radicalização do movimento camponês e das lutas urbanas, suscitavam inquietação no movimento estudantil. Os campus universitários foram palco de grandes agitações políticas, ligando a luta dos estudantes à luta de todo o povo. Apesar das medidas estatais de controle das universidades segundo os interesses imperialistas, lutando contra o violento aparato repressivo do regime militar fascista, os estudantes participavam ativamente na luta de classes, não deixando passar em branco um só acontecimento no Brasil e no mundo sem que se expressassem. Muitos jovens saíram das escolas e universidades engajando-se na luta armada.
Essa combatividade era fruto de agudo debate político e ideológico entre as correntes revolucionárias, que mesmo sendo hegemonizadas por concepções pequeno-burguesas, estavam no campo da luta contra a ditadura e o imperialismo. Nenhum avanço do Imperialismo norte-americano foi executado sem que bandeiras ianques queimassem em labaredas. Nenhuma cláusula do acordo MEC-USAID foi implementada na universidade sem que houvesse muita resistência, greves políticas, paralisações e etc.
Mas, devemos compreender que, apesar de toda sua combatividade, de uma forma geral, o movimento estudantil no Brasil expressou o descontentamento das classes médias oprimidas pela ditadura militar e, na sua radicalização não conseguiu ir além do radicalismo pequeno-burguês. Limitado por essa concepção não se fundiu profundamente às massas operárias e camponesas, terminando por ser derrotado pela ditadura.